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Saúde: Benefícios e cuidados com os pés
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Quando uma criança está aprendendo a andar, os pais são instruídos a deixar esse processo acontecer naturalmente e sem sapatos. Isso ocorre porque os sapatos podem afetar a maneira como uma criança usa os músculos e os ossos dos pés.
As crianças também recebem feedback do chão quando andam descalças, e isso melhora sua propriocepção (consciência do corpo no espaço), além de ajudar a fortalecer a musculatura e a formar o arco plantar.
À medida que crescemos, enfiamos os pés nos sapatos e perdemos os benefícios advindos de andar descalço porque temos a ideia de proteger contra perfurações e microrganismos.
É por isso que os defensores de correr com tênis minimalistas e andar descalço falam tanto em voltar a exercitar a musculatura intrínseca do pé, que chamamos de core dos pés, incentivando todos nós a deixarmos nossos pés livres para que isso ocorra.
“Quais são os benefícios de andar descalço?”
Recebi essa pergunta no meu site e quis responder aqui em forma de texto para todos, pois o benefício mais direto ao andar descalço é que isso restaura mais de perto nosso padrão de caminhada “natural “, também conhecido como nossa marcha fisiológica.
Mas se você for a uma loja de esportes vai observar vários pares de sapatos diferentes e verá que muitos deles têm bastante amortecimento e suporte. Dependendo do modelo, o drop (diferença entre a altura em que seu pé fica apoiado na base do calcanhar do calçado e a altura do apoio da planta do pé dentro do tênis) é bem elevado.
Embora esse estofado do tipo travesseiro possa parecer incrível quando você anda com esse tipo de tênis, ele pode impedir que você use certos grupos musculares que podem realmente fortalecer seu corpo. E muda o padrão de marcha onde a aterrissagem acaba acontecendo mais de calcanhar.
Como isso ocorre?
A médica ortopedista e corredora Ana Paula Simões mostra que os músculos dos pés são estimulados quando andamos, corremos e nos exercitamos descalços — Foto: Acervo pessoal
À medida que caminhamos (ou corremos) nosso pé ativa os músculos intrínsecos, os músculos das extremidades inferiores e os do núcleo do pé, que precisam manter um nível de contração para criar tensão nos músculos e na fáscia das pernas e para absorver as forças de impacto que ocorrem toda vez que um pé atinge o chão. Em um pé saudável, esse mecanismo de tensão será iniciado quando os nervos sensoriais forem estimulados. Eles respondem principalmente à vibração que vem do solo a cada passo.
No entanto, após uma vida inteira de sapatos projetados para minimizar essas sensações, esses nervos não respondem, por desuso. Portanto, as forças de impacto não são correspondidas e não são mais absorvidas pelas articulações, tendões e ossos, e sim pelos amortecedores dos tênis. Isso levou a uma epidemia de fascite plantar, tendinopatias e fraturas por estresse.
Outros benefícios de andar descalço incluem:
Melhor controle da posição do pé ao atingir o chão;
Melhorias no equilíbrio, propriocepção e consciência corporal, que podem ajudar no alívio da dor;
Melhor mecânica dos pés, o que pode levar a uma melhor mecânica dos quadris, joelhos e coluna;
Manutenção da amplitude de movimento adequada nas articulações do pé e tornozelo, além de força e estabilidade adequadas nos músculos e ligamentos;
Alívio de sapatos mal ajustados, que podem causar joanetes, dedos em garra martelos ou outras deformidades nos pés;
Músculos das pernas mais fortes, que suportam a região lombar.
Perigos potenciais
Andar descalço em sua casa é relativamente seguro. Mas quando você sai, você se expõe a riscos potenciais que podem ser perigosos. Sem força adequada no pé, você corre o risco de ter uma mecânica fraca da caminhada, aumentando assim o risco de lesões.
Isso é especialmente importante a considerar quando você começa a incorporar os pés descalços depois de passar boa parte da sua vida em sapatos: você precisa considerar a superfície que está sendo pisada. Embora possa ser mais natural caminhar ou se exercitar descalço, sem sapatos, você está suscetível a lesões no terreno (como em superfícies ásperas ou molhadas ou problemas com temperatura, vidro ou outros objetos pontiagudos no chão). Já atendi pacientes com perfurações graves por correr descalço na praia por exemplo.
Você também tem a chance de expor os pés a bactérias ou infecções prejudiciais ao andar descalço, principalmente em lugares umedecidos. Mais atenção ainda para as pessoas imunodeprimidas, como pacientes com diabetes. Neuropatas que têm menos sensibilidades nos pés devem sempre consultar seu médico antes de andar descalço. A neuropatia periférica pode fazer com que sofram ferimentos na parte inferior dos pés e não percebam.
Como começar?
Caminhar ou mesmo correr descalço só é saudável quando os músculos do pé são treinados e preparados (lembre-se de que cada pé contém 26 ossos, um quarto de todos os ossos do corpo, junto com 33 articulações e mais de 100 músculos e tendões). Isso significa que os músculos dos pés, assim como outros músculos, precisam ser estimulados lentamente para desempenhar sua função. Saber andar e exercitar-se descalço leva tempo, paciência e as informações corretas. Portanto, antes de abandonar seus sapatos em favor de uma abordagem mais natural para caminhar e se exercitar, há algumas coisas a considerar.
Comece devagar. Você precisa ser paciente e começar com sessões curtas de 15 a 20 minutos de caminhada descalça. É vital que você permita que seus pés e tornozelos se adaptem ao novo ambiente. À medida que seus pés se acostumam a andar sem sapatos, você pode aumentar a distância e o tempo.
É normal sentir alguma nova dor ou desconforto. Enquanto andar descalço traz benefícios, há perigos que devem ser considerados: sem força adequada no pé, você corre o risco de ter pouca mecânica para caminhar, aumentando assim o risco de lesões. Isso é especialmente importante a considerar se você começar a incorporar os pés descalços depois de passar boa parte da sua vida com sapatos.
Experimente dentro de casa. É uma boa ideia deixar seus pés descalços se acostumarem com as superfícies seguras da sua casa. A melhor coisa a fazer seria usar uma superfície interna que você sabe que está livre de algo em que você pode pisar acidentalmente. Para despertar os nervos sensoriais nos pés, tente andar descalço em casa o máximo possível, de preferência em superfícies irregulares, e use bolas macias sob os pés.
Pratique em superfícies seguras. Depois de dominar o ambiente interno, tente caminhar em superfícies externas menos perigosas, como gramados, trilhas de borracha, praias e grama.
Considere usar um tênis minimalista. Eles são calçados com solado baixo, que permitem um maior contato como solo e absorvem menos impacto, simulando a sensação de estar descalço, mas protegendo os pés de riscos. Enquanto seus pés estão se ajustando a menos estrutura e estofamento dos sapatos, considere usar um sapato minimalista antes de andar completamente descalço.
Experimente exercícios de equilíbrio. Recomendo que você comece com exercícios simples de equilíbrio, como ficar em um pé ou pressionar os dedos dos pés e abaixar lentamente. Faça devagar, sentindo cada músculo do seu pé ativar.
Tente uma atividade que exija que você esteja descalço. Aproveite as atividades que já são realizadas com os pés descalços, como yoga, Pilates ou artes marciais.
Examine os pés em busca de lesões. Todos os dias, examine a parte inferior dos pés em busca de lesões, pois muitos têm uma sensação reduzida nos pés. Eu gosto de praticar esse item após o banho, secando com calma entre os dedos e depois massageando com hidratante; isso ajuda também a relaxar e alongar com a pressão dos dedos.
Atividades mais árduas, como corrida ou caminhada com os pés descalços, não devem ser incorporadas até que você gaste tempo suficiente preparando os pés para esse tipo de atividade.
Se você sentir dor ou alguma lesão cutânea nos pés depois de iniciar as atividades descalço, pode ser necessário voltar ao calçado de apoio e recomeçar lentamente quando os pés estiverem curados. Todo cuidado é pouco.
Andar descalço enquanto se caminha ou se exercita tem benefícios, desde que você siga as precauções de segurança e participe com moderação.
Se você tiver alguma dúvida sobre sua própria segurança ou saúde dos pés, é uma boa ideia conversar com seu médico antes de expor seus pés descalços à natureza por um longo período de tempo, principalmente se você tiver alterações anatômicas, como pé cavo e pé plano excessivos, joanete ou outras alterações. Qualquer dúvida: me escreva!
Bons treinos, valentes!
Dra. Ana Paula Simões, Médica mestre em ortopedia e traumatologia pela Santa Casa de São Paulo e membro da Sociedade Brasileira de Medicina Esportiva, é professora da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. @DraAnaPSimoes.
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